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História Honda CB 750 Four

A máquina que mudou o mundo. O lançamento da Honda CB 750 Four em 1968 fez uma revolução no universo motociclístico: foi a pá de cal para as inglesas e estabeleceu novos parâmetros de projeto e tecnologia


K0: imponente e belíssima até os dias de hoje
K0: imponente e belíssima até os dias de hoje

Finalmente, a história da Honda CB 750 Four! Assim como o Fusca (ou quase), essa é uma moto que também determinou os padrões dos modelos que viriam posteriormente. Ou, como estamos até cansados de ler e ouvir, um “divisor de águas”, clichê que ilustra o que aconteceu com as motocicletas entre o antes e o depois da Honda CB 750 Four.

A história conhecida da “sete galo” (acho que não preciso explicar a origem desse apelido) começou em 1968, mais precisamente no dia 26 de outubro, no salão de Tóquio (Tokyo Motor Show), no momento em que a grande novidade era apresentada ao grande público. Para mim, no entanto, começou antes, de tanto ouvir meu pai e seus amigos motociclistas discutirem sobre como se deveria pilotar uma motocicleta de muita potência. Acho que ele sabia do que falava, já que, entre outras motocicletas, ele tinha uma HRD Vincent Rapide de 1951.


A versão de 1970, chamada de K0, com fendas nas tampas laterais, carcaça e suporte do farol pintados na cor da moto. A pinça (ou cáliper) do freio dianteiro saiu na cor cinza e nas versões posteriores recebeu a cor preta. Até hoje um visual arrebatador e emocionante
A versão de 1970, chamada de K0, com fendas nas tampas laterais, carcaça e suporte do farol pintados na cor da moto. A pinça (ou cáliper) do freio dianteiro saiu na cor cinza e nas versões posteriores recebeu a cor preta. Até hoje um visual arrebatador e emocionante

Foi nesse mesmo ano de 1968 que eu conheci a maior e mais potente motocicleta até então fabricada pela Honda, a CB 450 DOHC, conhecida também, em versões anteriores, como Black Bomber. Para mim, com oito anos de idade, ela era uma belíssima motocicleta, apesar de que, lado a lado, a HRD era ainda maior. Sim, elas conviveram no meu quintal.

Até que chegou a CB 750 Four. Só a vi em fotos, a princípio, mas ela me pareceu estranha, com o motor mais largo que o tanque e outros detalhes que não eram muito comuns na época, como o para-lama dianteiro cobrindo quase a metade do pneu e aquele monte de escapamentos.

Não preciso nem dizer que meu pai ficou fissurado pela motocicleta e só sossegou quando comprou a sua, uma K2 prata zerinho. Depois disso, parecia que os dois, ele e a moto, estavam costurados, não se largavam.


Acima, o motor SOHC de 4 cilindros em linha refrigerados a ar, com alimentação por uma bancada de 4 carburadores Keihin, nem tão fáceis de equalizar: 67 cv. Detalhe da chave de ignição na lateral
Acima, o motor SOHC de 4 cilindros em linha refrigerados a ar, com alimentação por uma bancada de 4 carburadores Keihin, nem tão fáceis de equalizar: 67 cv. Detalhe da chave de ignição na lateral

VANGUARDA TÉCNICA

A história oficial da Honda CB 750 Four continuou bem forte, com repercussão mundial. Ouvi muito sobre ela na época, mas, se eu já fosse um jornalista especializado naquele tempo, teria absorvido melhor cada uma das conversas.

O que mais surpreendeu o mercado de motocicletas por ocasião do lançamento da Honda CB 750 Four, foram os diversos detalhes técnicos nunca antes aplicados em uma motocicleta de série, ou, pelo menos, não todos ao mesmo tempo. Coisas como freio a disco na roda dianteira, quatro tubos de escapamentos, partida elétrica e o próprio motor de quatro cilindros em linha montado transversalmente. Seus números, para aquele tempo, eram respeitáveis, como os 67 cv de potência, quase levando a moto aos 200 km/h (quase, perdia da HRD), e o torque de seis quilos, que tornava a pilotagem sem pressa bem agradável. A resposta ao acelerador, no entanto, era bem forte.

É neste ponto que a real história da “sete-galo” – nunca gostei do apelido, mas o utilizo frequentemente, meio que no automático – começa. Ela chegou atropelando a concorrência, no sentido literal da palavra, já que a Kawasaki estava com uma 750 de quatro cilindros em linha e quatro tempos praticamente pronta para ser lançada, quando a Honda CB 750 foi apresentada no salão. Recolheram as armas e projetos e partiram para algo melhor, que foi a Kawasaki Z1 de 1972. Bem melhor. Mesmo.

Logo em seguida à apresentação, quatro protótipos da Honda CB 750 Four foram enviados para testes de pista e, dizem, duas delas ainda existem e representam o santo graal das motocicletas japonesas.


Duas motos do autor: a CB 450 DOHC, que foi a maior Honda até 1968, e a CB 750 K2, já com suporte cromado do farol, que tem carcaça pintada de preto.
Duas motos do autor: a CB 450 DOHC, que foi a maior Honda até 1968, e a CB 750 K2, já com suporte cromado do farol, que tem carcaça pintada de preto.

FUNDIDAS EM AREIA

As primeiras 7.414 Honda CB 750 Four produzidas, no entanto, apesar de não terem um passado tão glorioso, são sim, objetos de plena adoração pelos colecionadores. É que elas tiveram partes do motor fundidos no chamado molde de areia, um método barato conhecido como sandcast.

Só mais tarde o fabricante notou que a quantidade a ser produzida deveria ser muito maior do que a inicialmente prevista, graças ao estrondoso sucesso do modelo (a demanda foi de cerca de dez vezes mais do que a expectativa), investiram no processo definitivo e mais caro, o diecast, que molda os componentes em fundição sob pressão.

As Honda CB 750 Four “sandcast”, como assim ficaram conhecidas, se tornaram raras e muito procuradas, mesmo entendendo-se que o molde de areia era, na verdade, um molde de aço, mas com fundição de baixa pressão e acabamento final que deixava o produto parecido com um feito realmente no molde de areia.

Outra peculiaridade na história da Honda CB 750 Four é o fato de que, das quase 500 mil unidades produzidas, apenas uma pequena porcentagem, cerca de 1%, eram sandcast, o que explica serem tão desejadas, mas não raras. Afinal, são 7.414 motores, um número não tão pequeno. Fora o fato inegável de que os motores posteriores, fundidos sob pressão, certamente tinham melhor qualidade do que os chamados sandcast. Mas como discutir com colecionadores?


Um conjunto inédito de tecnologias à época: disco dianteiro, motor quatroem- linha transversal, partida elétrica (apesar de manter o pedal de partida) e 4 escapes.
Um conjunto inédito de tecnologias à época: disco dianteiro, motor quatroem- linha transversal, partida elétrica (apesar de manter o pedal de partida) e 4 escapes.

O primeiro ano da Honda CB 750 foi inesperado. Além do volume bem maior do que o previsto, o baixo preço inicial de US$ 1.295 para o mercado norte-americano fez com que os pedidos superassem em muito a capacidade de produção, inclusive fazendo surgir ágio. Aumentaram para US$ 1.495, mas mesmo assim ainda era pouco perto do que os ávidos compradores estavam dispostos a pagar.

A Honda CB 750 Four chegou ao Brasil em setembro de 1969, em sua primeira versão de série, que depois ficou conhecida como K0 (K-zero), produzida até outubro de 1970. A CB 750 Four K0 pode ser facilmente reconhecida pela carcaça do farol e seus suportes pintados na mesma cor do tanque, assim como as tampas laterais com aberturas para entrada de ar. O detalhe mais sutil, no entanto, são as luzes indicadoras do painel dentro dos relógios e não em um pequeno mostrador separado sobre o guidão, onde foram instaladas nas versões posteriores.

A versão seguinte, já denominada oficialmente como K1, foi produzida até o fim de 1971. Ainda tinha os detalhes do farol e do suporte pintados, e os relógios com as luzes incorporadas como na K0, mas já trazia uma nova lanterna traseira e as tampas laterais sem as fendas. O logotipo do tanque passou a ser branco e a pinça do freio preta.

Para nós, brasileiros, a Honda CB 750 Four K2, produzida a partir de 1972, foi importada até 1975, criando a falsa ideia de que as motos vendidas aqui em 1973, 1974 e 1975 eram, respectivamente, K3, K4 e K5, versões comercializadas em poucos países. Para aumentar ainda mais a confusão, as K2 passavam por uma “atualização” antes de serem vendidas aqui, ganhando itens, como, por exemplo, a grande lanterna traseira.


DUAS VERSÕES NO BRASIL

Em 1976, quase no fechamento definitivo das importações no Brasil (situação que perdurou no país por 24 anos), chegou a Honda CB 750 Four K6, essa, sim, legítima, reconhecida pela pintura do tanque com um grande aplique no lugar da faixa estreita da K2.

Paralelamente à comercialização da Honda CB 750 Four K6, o concessionário brasileiro da marca recebeu naquele ano uma nova motocicleta, a Honda CB 750F, também vendida por muito pouco tempo. A “F” tinha tanque de combustível mais esguio, rabeta na mesma cor e escapamento 4-em-1 de série. Sua sucessora, a F2, de 1977, tinha o motor preto e rodas Comstar. Foram produzidas, ainda, as versões K7 e K8, em 1977 e 1978, que nunca chegaram a ser oficialmente vendidas aqui.


Acima protótipo de desenvolvimento do projeto e testes de rua e de pista com protótipos (um tem 2 freios a tambor).



A Honda CB 750 estava chegando ao fim de uma gloriosa era, mas ainda havia algumas novidades para apresentar. Uma delas foi a CB 750A, para os mercados norte-americano e japonês, com câmbio automático de apenas duas marchas. A outra foi a bela Honda CB 750 Bol D’Or, que tinha motor de quatro válvulas por cilindro DOHC e maior potência. Por fim, para agradar ao público norte-americano, a Honda CB 750C Nighthawk, de 1981, tentava entrar naquele fechado mercado custom, até hoje o domínio das Harley-Davidson.

Não é mais nenhum exagero dizer que a Honda CB 750 Four é um marco para a indústria motociclística mundial. É mais que certo que, caso perguntássemos a qualquer entusiasta de motocicletas qual seria a sua moto colecionável de sonho, a resposta mais frequente seria Honda CB 750 Four. Com exceção, talvez, de alguns colecionadores mais radicais, que buscam raridades únicas, já que a CB 750 Four foi uma motocicleta essencialmente popular de enorme sucesso e larga produção.

Uma popular clássica, no entanto, eleita a “motocicleta do século” por júri conceituado. Dessa forma, tenho muita curiosidade de conhecer um futuro bem distante, só para descobrir como e qual será a motocicleta do século 21.

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